Subvenção Pública ou Custeio de Benefícios Tarifários?

Marcos Bicalho dos Santos *

A definição das fontes de custeio para os inúmeros benefícios tarifários existentes no transporte público coletivo urbano, pleito setorial antigo de toda a comunidade dos transportes, está longe de ter uma solução eficaz e definitiva no Brasil.

A gravidade dessa questão reside no fato de que as inúmeras legislações federais, estaduais e municipais que criaram esses benefícios sociais não tiveram o cuidado de estabelecer quem deveria pagar a conta. A própria Constituição Federal de 1988, ao estabelecer a gratuidade para os idosos a partir de 65 anos, se omitiu nesse aspecto quando poderia ter remetido o assunto à regulamentação posterior.

Na falta de definição da fonte pagadora, toda essa conta que foi se acumulando com a promulgação de leis e mais leis foi sendo jogada nas costas dos usuários comuns do serviço, que hoje assumem um custo médio adicional de 18% nas tarifas para pagar essa despesa.

Essas omissões nas legislações representam hoje um custo extra para o setor de transporte coletivo urbano por ônibus da ordem de mais de R$ 5 bilhões por ano, ou seja, por mais incrível que possa parecer, um serviço público essencial, conforme definido na própria Constituição Federal, em vez de receber recursos dos orçamentos públicos, é obrigado a externalizar bilhões de reais por ano para subvencionar políticas públicas nas áreas de assistência social, educação e outras.

Temos que reconhecer que o problema é grande e a solução não é fácil. Entretanto, os caminhos para resolvê-lo não podem passar ao largo das distorções existentes, ou seja, os recursos públicos que venham a ser alocados para pagar os benefícios tarifários no transporte público urbano têm que ser originados e carimbados de acordo com a área beneficiada.

Em outras palavras, para clarear, recursos destinados a cobrir despesas com passes estudantis são recursos para a educação e não para o transporte público. As gratuidades dos idosos têm que ser cobertas com recursos alocados à assistência social e não ao transporte.

Infelizmente não é o que está acontecendo. Pressionadas pelos movimentos sociais de junho de 2013, que exigiram serviços de mais qualidade e tarifas menores, diversas administrações municipais apressaram-se em criar subvenções públicas, com o objetivo de aliviar os custos do setor e evitar os reajustes tarifários, designadas como subvenções “ao transporte”, mas destinadas na realidade ao custeio dos benefícios tarifários.

O caso mais emblemático é o da cidade de São Paulo, cuja subvenção pública “ao transporte”, que já existia antes das manifestações de junho de 2013, foi reforçada após o movimento nas ruas. Segundo a diretoria da SPTrans, em recente exposição pública, do total de recursos do orçamento público municipal classificado como subvenção “ao transporte”, apenas 28% refere-se especificamente a cobertura de custos de transporte. A maior parte, ou seja, 72%, é para cobrir gratuidades de idosos e estudantes.

Diversas cidades atualmente seguem no mesmo caminho de São Paulo, anunciando subvenção “ao transporte” que, na realidade, não produz nenhum reflexo na qualidade de prestação dos serviços. Na prática, cria-se uma imagem para a opinião pública de serviço subvencionado sem que o setor possa dar qualquer resposta em termos de melhoria da qualidade.

Definitivamente, temos que separar as duas coisas. Uma coisa é fonte de custeio para os serviços tarifários, com o objetivo de eliminar uma grande injustiça social com os usuários comuns do transporte público que arcam, sozinhos, com os custos de políticas públicas de outras áreas, que, a rigor, nada têm a ver com transporte. Arcam sozinhos com custos que deveriam ser distribuídos por toda a sociedade, já que a própria sociedade decidiu, por seus representantes nas casas legislativas, criar esses benefícios.

Outra coisa, totalmente diferente, é a subvenção pública ao transporte coletivo urbano que deve ser destinada exclusivamente a melhorar a qualidade dos serviços e garantir tarifas públicas acessíveis a todas as classes sociais, permitindo, dessa forma, avançar na direção de uma mobilidade racional e sustentável nas cidades brasileiras.

 

* Marcos Bicalho dos Santos, engenheiro civil e MSc. em engenharia de transporte, é diretor da NTU

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